Raiz do Sertão

 Transmitiu aos Paiacu, índios de paz e quase todos batizados, uma comunicação amistosa, convidando-os    a participar de um combate, com os Janduí, já previamente aliados ao regimento. De forma dissimulada, instigou discórdias entre as tribos Paiacu e Janduí, inimigas tradicionais, entregando armas e munições a estas últimas para atacar     as primeiras. Seu intuito era poder escravizar indígenas e tomar suas terras, com a desculpa de que estariam em guerra. 

Sem nada saber, como se acolhe um aliado, os Paiacu receberam-no e sua comitiva com festa. Quando começaram as danças e folgares, como se isso significasse um código, soldados da tropa e índios Janduí iniciaram a matança cujo desforço foi o cruento massacre dos indígenas. Meses depois do ocorrido, em carta ao governador geral, Navarro relatou os “bons serviços” que tinha feito. Segundo ele, executara apenas mais uma “guerra justa” contra os índios que estavam rebelados há décadas. Como Navarro, outros bandeirantes agiram de forma brutal contra os indígenas na região. Esse é um entre tantos episódios dramáticos da história colonial brasileira que compõe parte da importante, mas não conhecida, Guerra dos Bárbaros. Ocorrida entre os anos de 1650 e 1720, a Guerra dos Bárbaros envolveu os colonizadores e os povos nativos chamados Tapuia e teve como palco uma área que correspondia em termos atuais a um território que inclui os sertões nordestinos, desde a Bahia até o Maranhão. 

        A denominação Tapuia foi dada pelos cronistas da época, e perpetuada pela historiografia oficial, aos grupos indígenas com diversidade linguística e cultural que habitavam o interior, em distinção aos Tupi, que falavam a língua geral e se fixaram no litoral. Estudos atuais demonstram que esses povos pertenceram aos seguintes grupos culturais: os Jê, os Tarairiu, os Cariri e os grupos isolados e sem classificação. Entre eles podem ser citados os Sucurú, os Bultrim, os Ariu, os Pega, os Panati, os Corema, os Paiacu, os Janduí, os Tremembé, os Icó, os Carateú, os Carati, os Pajok, os Aponorijon, os Gurgueia, que lutaram ora contra ora a favor dos colonizadores de acordo com as estratégias que visavam à sua sobrevivência. Se por um lado a guerra envolveu diversos povos indígenas, muitos deles inimigos tradicionais, por outro lado os colonizadores também entraram em conflito entre si pelas terras e mão de obra escrava nativa, atraindo os mais variados setores da sociedade colonial em formação, tais como: os sesmeiros, os moradores, os religiosos, os bandeirantes, os foreiros, os vaqueiros, os rendeiros, os capitães-mores, os mestres de campo. Embora tenha tido uma longa duração, cerca de setenta anos, e tenha sido contemporânea à existência do quilombo dos Palmares, a Guerra dos Bárbaros pouco aparece na historiografia, sendo praticamente desconhecida.

        A omissão dessa guerra nos livros didáticos e os raros livros de estudiosos especialistas sobre o episódio revelam o desprezo dado ao tema da resistência indígena e do violento processo de conquista lusitano no sertão nordestino. Genericamente denominado de Guerra aos Bárbaros, esse conflito armado de caráter genocida também foi chamado de Guerra do Recôncavo (em menção ao recôncavo baiano, onde aconteceram as primeiras lutas armadas), Guerra do Açu (em referência à região do Açu, no Rio Grande do Norte, onde ocorreram os principais conflitos) e Confederação dos Cariris (por terem sido esses grupos indígenas um dos mais combatentes).   A designação “bárbaros” era dada pelos colonizadores e cronistas da época aos povos nativos que habitavam à região e ofereciam resistência à ocupação do território pelos portugueses. Essa terminologia etnocêntrica convinha ao discurso colonizador que propagava a catequese e a “civilização” dos povos indígenas nos moldes culturais do europeu ocidental. Eram descritos como povos selvagens, bestiais, infiéis, traiçoeiros, audaciosos, intrépidos, canibais, poligâmicos, enfim, “índios-problema”, pois não se deixavam evangelizar e civilizar. Eram, portanto, considerados os principais obstáculos à efetiva colonização. 

       Essa imagem reforçou os argumentos do conquistador de impetrar uma “guerra justa” para extirpar os “maus” costumes nativos, satisfazendo tanto as necessidades de utilização de mão de obra pelos colonos quanto à garantia aos missionários do sucesso na imposição da catequese. O resultado foi a criação de dispositivos legais que legitimavam uma guerra de extermínio. É isso que nos confirma o documento datado de 1713, quando os povos nativos já estavam drasticamente reduzidos ou aprisionados e aldeados, no qual o governador de Pernambuco insiste ser “necessário continuar a guerra até extinguirem estes bárbaros de todo ou do menor ficarão reduzidos a tão pouco número que ainda que se queiram debelar o não possam fazer”. 

       Embora o resultado dessa guerra tenha sido catastrófica para os povos nativos da região, é importante destacar a sua tenaz resistência, que retardou o processo de conquista da terra pelos colonos nos sertões nordestinos por quase dois séculos. Os Tapuia desenvolveram uma forma de luta singular na história da resistência indígena no Brasil. Apesar de um passado caracterizado por conflitos internos entre as diversas tribos, esses povos conseguiram, através de uma série de alianças, alcançar um certo grau de coesão na sua luta contra o colonizador que desejava remover os habitantes indígenas da região para povoá-la de gado (foi o pastoreio que permitiu a ocupação econômica, pelos colonizadores, em todo o interior do Nordeste).

       A partir do século XVII, a pecuária foi paulatinamente sendo levada para o interior da região, espalhando-se pelo agreste e alcançando o sertão. A criação de gado permitiu a ascensão econômica e social de alguns habitantes do local, e a Guerra dos Bárbaros tornou-se um meio para alcançar esse fim, pois, por seu intermédio, conquistava-se o direito a sesmarias, condição essencial para a montagem de uma fazenda de gado. A resistência indígena foi a maior barreira à expansão da pecuária, pois ela só se desenvolveu, ampliando o seu mercado, após o final do conflito, quando as terras estavam “limpas” dos indígenas.

       Essas sangrentas lutas da chamada Guerra dos Bárbaros, que dizimaram e desestruturaram muitas tribos indígenas, têm um rico significado histórico no quadro da ocupação dos sertões nordestinos na época colonial, representando um dos mais terríveis genocídios que a História oficial não conseguiu esconder.

Por Maria Idalina Pires – Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco, professora da Pós-Graduação em Arqueologia e do Colégio de Aplicação do Centro de Educação da mesma universidade – no livro Dicionário de Datas da História do Brasil, publicado pela Editora Contexto

Um pouquinho de nossa história quase recente.....

            História do município e cidade de Franca, Vila Franca do Imperador. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A história da região denominada Sertão do Capim Mimoso próxima aos Rio Pardo e rio Sapucaí tem início com os bandeirantes:

A partir da bandeira do Anhanguera , em 1722, que construiu o “Caminho de Goiás”, ou “Estrada dos Goiases” que ligava a cidade de São Paulo até as minas de ouro de Goiás, que naquela época pertencia à Capitania de São Paulo e passava pela região onde depois surgiu Uberaba-MG.

Começam a surgir, a partir de então, os famosos “pousos” de tropeiros, locais onde os paulistas paravam para descansar – eles e os animais de carga -, durante as viagens que faziam em sua busca pelo ouro no interior do Brasil. O pouso que deu origem à cidade de Franca era conhecida, na época, pelos bandeirantes, por “Pouso dos Bagres”. 

No final do século XVIII, havia dispersos na região vários desses pousos. Em 1779, moravam cerca de uma centena de pessoas, no sertão do Rio Pardo pertencente à Vila de Mogi Mirim. Para uma melhor organização do local, foi criada uma Companhia de Ordenanças e nomeado, como seu Capitão, o português Manoel de Almeida. Posteriormente comandou o distrito, a partir de 1804, o Capitão Hipólito Pinheiro.

No início do século XIX, os filhos de Manoel de Almeida (Antônio Antunes de Almeida e Vicente Ferreira de Almeida) doam suas terras para a construção de uma capela,  benzida pelo padre Joaquim Martins Rodrigues.

Juntam-se, depois, a essa população mineiros (chamado de geralistas) e goianos, que, devido à decadência da mineração em suas regiões, começam a se instalar no          “Belo Sertão do Rio Pardo”, por incentivo do governador-geral da Capitania de São Paulo, António José da Franca e Horta, ao qual se deve o nome da cidade.

Esses pioneiros reivindicaram junto ao governo geral do Brasil a criação de uma freguesia porque a freguesia mais próxima era a de Mogi Mirim, a centenas de quilômetros de distância.

A Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Franca foi criada em 3 de dezembro de 1805, pertencendo ao termo da Vila de Mogi Mirim.

O território original da Freguesia da Franca, que fora desmembrado da Vila de Mogi Mirim, abrangia a região de Batatais e estendia-se até Igarapava e Guaíra e era muito extenso. Foi, porém, bastante reduzido com a criação de novos municípios: Batatais em 1839, Igarapava em1873, Ituverava e Patrocínio Paulista em 1875, São José da Bela Vista em 1948, Cristais Paulista em 1959, Restinga, Jeriquara e Ribeirão Corrente em 1964. 

Em 1821, é criada por Dom João VI a “Vila Franca Del Rey”, que só foi instalada em 28 de novembro de 1824, sendo o primeiro presidente da Câmara Municipal o Sargento-Mor José Justino Faleiros, tronco da Família Faleiros da região de Franca, empossado, junto com os demais vereadores, no dia 30 de novembro de 1824.

Com a independência do Brasil, passa a se chamar Vila Franca do Imperador, uma homenagem a D. Pedro I do Brasil.

Em 1821, Minas Gerais tenta anexar a região, mas devido à resistência dos francanos, a tentativa falha. Esse episódio está registrado nobrasão da cidade, com a cidade fortificada e o lema “GENTI MEAE PAULISTAE FIDELIS” (Fiel à Minha Grei Paulista).

Em 1838 houve em Franca uma rebelião que ficou conhecida como Anselmada.

Em 1839 é criada a comarca da Franca. Neste ano, Franca perde grande parte de seu território para a criação da Vila de Batatais.

Pela lei provincial nº 21, de 24 de abril de 1856, Franca é elevada à categoria de município e cidade.

Na década de 1830, francanos, especialmente das famílias Garcia Leal, Correia Neves e da família Souza, iniciaram a povoação da região de Santana do Paranaíba no atual    Mato Grosso do Sul.

O município recebeu muitos imigrantes. Com a expansão do café para o Oeste Paulista vêm os imigrantes, sobretudo italianos. A partir destes imigrantes, monta-se a primeira indústria da cidade, calçadista, que desenvolve-se principalmente a partir da década de 1920.

Franca participou da Guerra do Paraguai com os Voluntários da Franca e com o famoso Guia Lopes.

Na década de 1890, Franca passa a ser servida pela Estrada de Ferro Mogiana, mas, no início do século XX, o ramal de Franca foi abandonado e os trilhos retirados porque a Estrada de Ferro Mogiana construiu outro ramal, uma variante, ligando Ribeirão Preto a Uberaba sem passar por Franca.

A cidade empenha-se durante a Revolução Constitucionalista de 1932, na qual morreram por São Paulo seis cidadãos francanos.

Atualmente, destaca-se no setor da indústria de calçados masculinos, mas as indústrias calçadistas de Franca já estão dando atenção e produzindo também calçados femininos, ainda que, até hoje, o café tenha ativa participação na economia do município.

  A história da emancipação começa quando Hipólito Antônio Pinheiro, ao assumir o posto de Capitão de Ordenanças do “Belo Sertão do Rio Pardo” em agosto de 1804, praticou os primeiros atos efetivos da fundação do povoado. Em 29 de agosto de 1805, foi criada a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Franca e do Rio Pardo, simplificada para Franca, em homenagem ao Governador da Capitania, Antônio José da Franca e Horta. O arraial foi assentado em uma colina entre dois córregos: Bagres e Cubatão, em terrenos da Fazenda Santa Bárbara, doadas para este fim em 3 de dezembro de 1805, por Antônio Antunes de Almeida e seu irmão Vicente Ferreira Antunes de Almeida. Nessa ocasião foi erguida uma Capela e celebrada a primeira missa pelo Padre Joaquim Martins Rodrigues.

Essa Capela depois foi denominada de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. A Igreja Matriz, iniciada em 1809, foi construída onde hoje está a Fonte Luminosa.

Em 1821, Dom João VI cria a Vila Franca Del Rei, porém por “brigas” e interesses políticos a mesma não foi imediatamente instalada. Somente em 28 de novembro de 1824 é que a Freguesia de Franca se emancipa de Moji Mirim, sob a denominação de Vila Franca do Imperador. Instalada no dia seguinte pelo Ouvidor Freire (Antônio D’Almeida e Silva Freire da Fonseca) da Comarca de Itu é demarcada sua área e denominados seus primeiros logradouros: Largos da Alegria (atual Nossa Senhora da Conceição) e da Aclamação (atual Barão da Franca); e ruas; do Comércio, da Primavera (atual Voluntários da Franca), do Adro (atual Monsenhor Rosa), Nova (atual Major Claudiano) e do Ouvidor. O bairro da Estação, antigo Alto da Boa Vista, surgiu a partir da implantação da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro, (depois Ferrovias Paulistas S/A - Fepasa), inaugurada em 05 de abril de 1887. )

 Guerra dos Bárbaros  

 O terrível genocídio que a História oficial não conseguiu esconder

  Em 4 de agosto de 1699, o bandeirante paulista, comandante de Terço (companhia militar criada para combater        os indígenas) e mestre de campo Manuel Álvares de Moraes Navarro foi responsável pelo assassinato de 400 índios  Paiacu e a prisão de 250, incluindo crianças e mulheres, habitantes da ribeira do Jaguaribe. 

Sob o pretexto de combater povos indígenas, inimigos dos colonizadores, entre eles os Carateú, os Icó e os Carati, bem como procurar aliados, chegou ao rancho dos Paiacu acompanhado de 130 homens armados e mais de 200 índios de Terço.